"Chegámos!", pensei.
A viagem foi cansativa, mas a aterragem foi suave. A azáfama dos minutos seguintes adivinhava-se e fez-me lembrar um pequeno formigueiro. Daqueles formigueiros onde parece quase impossível albergar um milhão de formigas. Os solavancos sucessivos durante o longo percurso entre o avião e a sala de recolha das bagagens faziam-me cócegas. Sempre fizeram. Lembro-me daquela viagem quando voltámos da Irlanda, a trepidação das rodinhas da mala de viagem faziam-me cócegas no corpo todo. Como a viagem a Paris e aos Açores e à Madeira. E a todo o lado onde fomos.
As vozes incompreensíveis dos funcionários e do pessoal da manutenção dos aviões multiplicavam-se às dezenas. Os sons de motores, uns que se aproximavam, outros que se afastavam, o barulho mecânico das passadeiras rolantes o som ainda quente das turbinas do avião faziam crescer ainda mais a ansiedade. Depois mais solavancos, e mais passadeiras rolantes. E mais vozes. Tudo nos era já familiar, embora não conseguíssemos decifrar uma única palavra. Tínhamos no entanto a certeza que esta interminável viagem estava prestes a chegar ao fim. Parecia um sonho.
Finalmente o silêncio instalou-se e o frio preencheu o espaço à nossa volta. Descansámos um pouco, mas agora a ânsia do reencontro, de ver aquela cara tão querida e familiar era quase insuportável.
Continuámos à espera, aguardando impacientes que nos viesse buscar. Os minutos amontoaram-se desordenadamente, as horas chegaram e varreram os minutos sem pedir licença. Mais horas se juntaram às primeiras e dos minutos já não havia memória.
"Será que se esqueceu de nós?", perguntei-me. Já aconteceu terem-nos mandado para Roma quando vínhamos de Viena de Áustria. Mas as vozes eram de uma linguagem familiar. Sim, estávamos em Lisboa, disso não havia dúvida. Mas ninguém nos vinha buscar.
Ao fim de algum tempo ocorreu-me o mais óbvio naquela situação. Claro, temos que ir às reclamações, aos "Perdidos e Achados". Tentámos encontrar o caminho no meio daquela confusão, mas...
Mas tão repentinamente como me veio esta ideia, ela se desfez. Mil pedaços de uma ideia antes simples e cheia de sentido, agora transformada em estilhaços. Sabia que os passageiros podiam reclamar as bagagens extraviadas, ou mesmo perdidas. Mas e o contrário? Não havia nenhum gabinete no aeroporto, nenhum balcão nem sequer um cantinho com uma placa que dissesse "Passageiros Perdidos e Achados". Não havia sítio para reclamar. Não havia sítio para existir.
Nós éramos a bagagem perdida, e ali ficámos.
A viagem foi cansativa, mas a aterragem foi suave. A azáfama dos minutos seguintes adivinhava-se e fez-me lembrar um pequeno formigueiro. Daqueles formigueiros onde parece quase impossível albergar um milhão de formigas. Os solavancos sucessivos durante o longo percurso entre o avião e a sala de recolha das bagagens faziam-me cócegas. Sempre fizeram. Lembro-me daquela viagem quando voltámos da Irlanda, a trepidação das rodinhas da mala de viagem faziam-me cócegas no corpo todo. Como a viagem a Paris e aos Açores e à Madeira. E a todo o lado onde fomos.
As vozes incompreensíveis dos funcionários e do pessoal da manutenção dos aviões multiplicavam-se às dezenas. Os sons de motores, uns que se aproximavam, outros que se afastavam, o barulho mecânico das passadeiras rolantes o som ainda quente das turbinas do avião faziam crescer ainda mais a ansiedade. Depois mais solavancos, e mais passadeiras rolantes. E mais vozes. Tudo nos era já familiar, embora não conseguíssemos decifrar uma única palavra. Tínhamos no entanto a certeza que esta interminável viagem estava prestes a chegar ao fim. Parecia um sonho.
Finalmente o silêncio instalou-se e o frio preencheu o espaço à nossa volta. Descansámos um pouco, mas agora a ânsia do reencontro, de ver aquela cara tão querida e familiar era quase insuportável.
Continuámos à espera, aguardando impacientes que nos viesse buscar. Os minutos amontoaram-se desordenadamente, as horas chegaram e varreram os minutos sem pedir licença. Mais horas se juntaram às primeiras e dos minutos já não havia memória.
"Será que se esqueceu de nós?", perguntei-me. Já aconteceu terem-nos mandado para Roma quando vínhamos de Viena de Áustria. Mas as vozes eram de uma linguagem familiar. Sim, estávamos em Lisboa, disso não havia dúvida. Mas ninguém nos vinha buscar.
Ao fim de algum tempo ocorreu-me o mais óbvio naquela situação. Claro, temos que ir às reclamações, aos "Perdidos e Achados". Tentámos encontrar o caminho no meio daquela confusão, mas...
Mas tão repentinamente como me veio esta ideia, ela se desfez. Mil pedaços de uma ideia antes simples e cheia de sentido, agora transformada em estilhaços. Sabia que os passageiros podiam reclamar as bagagens extraviadas, ou mesmo perdidas. Mas e o contrário? Não havia nenhum gabinete no aeroporto, nenhum balcão nem sequer um cantinho com uma placa que dissesse "Passageiros Perdidos e Achados". Não havia sítio para reclamar. Não havia sítio para existir.
Nós éramos a bagagem perdida, e ali ficámos.
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